Est. June 12th 2009 / Desde 12 de Junho de 2009

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quinta-feira, 24 de abril de 2014

Meditações - O Sol, que nunca pára,,,

Já a roxa manhã clara
As portas do Oriente vinha abrindo,
Dos montes descobrindo
A negra escuridão da luz avara.
O Sol, que nunca pára,
Da sua alegre vista saudoso,
Traz ella pressuroso
Nos cavallos cansados do trabalho,
Que respiram nas hervas fresco orvalho.
Se estende claro, alegre, e luminoso.
Os pássaros voando,
De raminho em raminho vão saltando;
E com suave e doce melodia
O claro dia estão manifestando.

A manhã bella, amena,
Seu rosto descobrindo, a espessura
Se cobre de verdura
Clara, suave, angélica, serena.
Oh deleitosa pena!
Oh effeito de amor alto, e potente!
Pois permitte, e consente,
Que ou donde quer que eu ande, ou donde esteja,
O seraphico gesto sempre veja.
Por quem de viver triste sou contente.
Mas tu. Aurora pura,
De tanto bem dá graças á ventura,
Pois as foi pôr em ti tão excellentes,
Que representes tanta formosura.

A luz suave, e leda,
A meus olhos me mostra, por quem morro;
Com os cabellos de ouro.
Que nenhum ouro eguala, se os remeda.
Esta a luz é que arreda
A negra escuridão do sentimento,
Ao doce pensamento:
O orvalho das flores delicadas
São nos meus olhos lágrimas cansadas.
Que eu choro co'o prazer de meu tormento.
Os pássaros que cantam.
Meus espíritos são, que a voz levantam,
Manifestando o gesto peregrino,
Com tão divino som, que o Mundo espantam.

Assi como acontece
A quem a chara vida está perdendo,
Que em quanto vai morrendo.
Alguma visão sancta lhe apparece;
A mim em quem fallece
A vida, que sois vós, minha Senhora,
A esta alma que em vós moura
(Em quanto da prisão se está apartando)
Vos estais junctamente apresentando
Em forma de formosa, e roxa Aurora.
Oh ditosa partida!
Oh gloria soberana, alta, e subida!
Se m'o não impedir o meu desejo,
Porque o que vejo, enfim, me torna a vida.

Porém a natureza
Que nesta pura vista se mantinha,
Me falta tão asinha,
Como o Sol faltar soe á redondeza.
Se houverdes que é fraqueza
Morrer em tão penoso, e triste estado,
Amor será culpado.
Ou vós, onde elle vive tão isento.
Que causastes tão largo apartamento,
Porque perdesse a vida co'o cuidado.
Que se viver não posso,
Homem formado só de carne, e osso;
Esta vida que perco, amor m'a deu;
Que não sou meu: se mouro, o damno é vosso.

Canção de cysne, feita em hora extrema,
Na dura pedra fria
Na memoria, te deixo em companhia
Do letreiro da minha sepultura:
Que a sombra escura já me impede o dia.

Luís de Camões

3 comentários:

João de Castro Nunes disse...


Se cada vez, Camões, que o amor bateu
à tua porta houvesses de morrer,
seria caso para se dizer
que a morte vezes mil te aconteceu!

JCN

João de Castro Nunes disse...

Segue para soneto soh o título de "Morrer por convenção":

Uns claros olhos não podias ver,
fazendo-te lembrar a cor do céu,
que não pensasses logo em falecer,
o que somente um dia te ocorreu.

Morrias no papel compondo versos
da mais excelsa e fina qualidade,
mas todos entre si muito diversos.

Sob este aspecto, és lídimo rival
de quantos já também na antiguidade
diziam ter sofrido… morte igual!

João de Castro Nunes

João de Castro Nunes disse...

Segue para soneto soh o título de "Morrer por convenção":

Uns claros olhos não podias ver,
fazendo-te lembrar a cor do céu,
que não pensasses logo em falecer,
o que somente um dia te ocorreu.

Morrias no papel compondo versos
da mais excelsa e fina qualidade,
mas todos entre si muito diversos.

Sob este aspecto, és lídimo rival
de quantos já também na antiguidade
diziam ter sofrido… morte igual!

João de Castro Nunes